terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

CAPACETE E COLETE PRA QUE TE QUERO

Segunda-feira, dia 10 de fevereiro de 2014 e o rádio já noticiava pela manhã. "Morre o cinegrafista da Rede Bandeirantes, Santiago Ilídio Andrade, após ser atingido por um rojão na manifestação de quarta-feira, 6, no Rio de Janeiro." Parei, pensei e disse: meu Deus!



(Foto: Agência O Globo)

Mais um membro da imprensa FOI MORTO. Assassinatos de uma maneira geral sempre causam estranhamento, indignação e revolta. Mas imagine a morte de um profissional de imprensa, que trabalhava em prol da informação de uma massa na qual milhões de habitantes acompanham. Pessoas que se informam enquanto assistem os noticiários em suas casas e em seus trabalhos. O assassino do cinegrafista também assistiu ao noticiário. TODOS. Civis de bem ou rebeldes, novos ou velhos, simpatizantes ou contrários à mídia, assistem aos telejornais. A informação move o mundo e faz de nós, pessoas mais culturalizadas e atualizadas sobre o que acontece ao nosso redor. Absurdo é ferir a imprensa num ato isolado de individual egoismo. Assim que socorrido, Santiago foi imediatamente encaminhado para um pronto atendimento também no centro do Rio e foi mantido em coma induzido desde então.

(Foto: Divulgação)

Até onde se sabe, o cinegrafista da Band fazia a cobertura da manifestação contra o aumento das passagens de ônibus, sozinho. SOZINHO? Explico. Na mídia televisiva, temos algumas equipes à disposição do veículo para qual trabalhamos. Essas equipes, quando completas, na maioria das vezes inclui um motorista (que também costuma desenvolver a tarefa de auxiliar técnico), um cinegrafista e um repórter. Quando a cobertura de uma notícia atual (o que chamamos de factual) é feita sem a presença de um repórter e visa apenas a captura de imagens para se dar conteúdo em estúdio, chamamos de equipe abelha. Nesse fim de semana, um tatuador, identificado como Fábio Raposos, se entregou à polícia e afirmou ter passado o rojão que atingiu o cinegrafista da Band a um manifestante encapuzado.

Não tão distante, um outro cinegrafista da emissora foi morto numa troca de tiros entre a Polícia Tática do Rio, o BOPE, e traficantes da favela de Antares. Gelson Domingos da Silva usava colete a prova de balas no momento que foi atingido pela munição de armamento pesado e veio à óbito. Dois repórteres cinematográficos mortos de maneira covarde em pouco mais de dois anos.

(Foto: Divulgação)

Óbvio. Ou não tanto quanto parece! Só eu percebo que jornalistas quando participam de coberturas policiais se tornam alvos fáceis para a vagabundagem? Imagine um bandido em fuga ou na necessidade de dispersão da atenção policial. Ele sabe que as autoridades, como o próprio nome diz, são especialistas no que fazem. Portanto, a forma mais possível, plausível e provável de impedir ou diminuir o avanço policial é ferindo um civil ou, principalmente, um integrante da mídia que estiver acompanhando. Em casos um pouco diferentes, dois outros integrantes da Rede também foram assassinados no mesmo período. A diferença é que Marcelo Casimiro e Gean Carlos Becker não exerciam a função profissional no momento de suas execuções. Ambos também por motivo banal. Marcelo foi vítima de dois tiros a queima roupa de um vizinho aposentado da Polícia Civil por causa de uma discussão que tinha como principal fator um entulho na rua. Gean foi morto com disparo na cabeça e sua ex. esposa foi a principal suspeita.

É amigo! Como sabe, a maior parte do tempo que trabalhei com TV, inclusive na Band Minas, foi acompanhando jornalismo policial e investigativo. Vemos cada coisa que é de embrulhar o estômago. E os cinegrafistas... Esses sim vêem mais coisas exóticas que a gente. Muitas vezes se expõem até mais que o repórter. Fiz um levantamento médio do salário de cinegrafistas que trabalham entre 2 e 3 anos em Belo Horizonte. Das quatro pessoas perguntadas sobre sua renda em TV, obtive o valor que varia entre R$ 2200 e R$ 2700. Bruto! Vale a pena se arriscar dessa forma? Acho que por dinheiro nenhum. A vida não é etiquetada e colocada a disposição para compra.

Bom profissional que era, o cinegrafista tinha em seu currículo dois prêmios sobre mobilidade urbana e já estava escalado para cobrir a Copa do Mundo FIFA no Brasil.

Santiago se foi. Não por sua vontade, mas pela irresponsabilidade de quem merece pagar pelos seus atos de rebeldia e violência contra a sociedade. Ele deixa sua esposa e uma filha.